Uma ação comum nas cidades brasileiras, entre tantas mazelas urbanas, é o desmonte do acervo patrimonial arquitetônico edificado. Tais ações, independente quais sejam as alegativas e justificativas apresentadas, causam tamanho dano e perda à memória, à identidade, às reminiscências e à representação social que cada edificação possui para um segmento específico e etário da sociedade, e infelizmente de forma quase sempre irreversível, que não temos condições de mesurar de imediato, salvo as primeiras consequências.
Conforme o arquiteto Frank Gehry, “arquitetura deve falar de seu tempo e lugar, porém, anseia por intemporalidade”, ou seja, dado o período histórico de sua construção onde a edificação se insere em um contexto socioeconômico, cultural, político e histórico, ela se apropria desse recorte espacial e o cristaliza, seja no espaço material e tangível dos estilos, tendências, estéticas e técnicas, seja no espaço subjetivo, imaterial e intangível das ideias, ideais, símbolos, signos e representações sociais.
Triste uma cidade que não preserva as suas edificações. Para cada edifício demolido é uma fração da história de seu povo que é apagada. Dessa forma, em breve, seremos um povo sem lembranças, sem memória, sem identidade e pior, sem referências culturais e históricas que fundamentavam as dinâmicas sociourbanas de um povo enquanto coletividade. É fato quase padrão e sistemático que após décadas de abandono, uma edificação venha a apresentar uma situação estrutural delicada, mas nada que um devido investimento não possa recuperar. O problema é que para os proprietários e para prefeitura não compensa tal investimento e dessa forma e sob ótica tão pequena e voltada somente para a lucro, eles acreditam que a história e toda a sua força de representação para tantas gerações não vale a pena ser resgatada.
Esse processo de destruição de nosso patrimônio edificado é célere e acontece a décadas! O lucro ou a possibilidade de ganhos leva tudo à roldão. Deixo claro que este texto que pauta os meus questionamentos se norteia pela negligência habitual que nosso patrimônio edificado está sujeito. Devemos de forma premente, incutir consciência crítica e formar arquitetos que entendam a cidade como referência, laboratório e espaço de criação que deve ser acima de tudo respeitada! Fazer entender que o arquiteto e urbanista é o artífice do espaço, independente da escala, e como tal deve ser escutado.
Observo com muita tristeza que o patrimônio edificado de nossa e de outras cidades brasileiras vem sendo destruído de forma arbitrária e em nenhum momento nossos órgãos institucionais (Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB e Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil – CAU) são consultados e da mesma forma observo certa omissão e distanciamento desses mesmos órgãos em relação ao processo de ocupação urbana que é totalmente direcionado a atender o lobby das construtoras.
Podemos sim fazer urbanização consciente, definido espaços equitativos e paritários e, principalmente, garantir a nossa fatia de mercado, sem ter que sacrificar nossa herança arquitetônica e o nosso patrimônio que é o legado de gerações pretéritas às novas gerações. Há tantas formas de se manter uma edificação à custo zero e até em alguns casos com lucro. Inclusive, garantir devido uso a edificações que estão “abandonadas”. Resolveria até questões sociais e de moradia!
Enquanto o poder público e a aceitação das pessoas para com a manutenção e o tratamento preventivo de cada edificação não for pensado e colocado em prática com a devida responsabilidade, mais e mais edificações serão condenadas e por fim, demolidas. Nós temos a consciência em tratar da nossa saúde física, correto? Por que essa consciência não se estende às edificações que fazem parte das nossas cidades? Precisamos também nos reeducar em dar início às nossas próprias manutenções prediais.
Que comecemos por cada um de nós, arquitetos e urbanistas! Quando no nosso mundo isso se torna verdadeiramente importante e cada um de nós lutarmos por essa causa, quem sabe, a sociedade e o poder público também comecem a enxergar essa pauta com mais respeito e comecem a dar a devida importância que ela tem. Pensemos nisso e comecemos a fazer parte dessa diferença!
Prof. Me. Frederico Augusto Nunes de Macêdo Costa
Coordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Ateneu
Doutorando em Arquitetura e Urbanismo, mestre em Geografia Urbana, especialista em Gestão Ambiental e em Geoprocessamento aplicado à Análise Ambiental e graduado em Arquitetura e Urbanismo.
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