O arquétipo da “Mulher Maravilha” e a produtividade excessiva: impactos da sobrecarga na saúde mental feminina

  • Categoria do post:Saúde
Você está visualizando atualmente O arquétipo da “Mulher Maravilha” e a produtividade excessiva: impactos da sobrecarga na saúde mental feminina

“Mulheres são ensinadas, ainda meninas, que esse é o seu papel, que ela deve cuidar do que é dela e do que é do outro” (Valeska Zanello).

Com o advento da modernidade e as exigências da produtividade capitalista, especificamente no que diz respeito ao mercado de trabalho, a mulher precisou se adequar as múltiplas funções, além da ocupação remunerada, acumulando assim outras como ser mãe, esposa, cuidar dos afazeres domésticos etc., intensificando, a sobrecarga física e emocional. Há o elogio contraditório de que mulheres que acumulam várias responsabilidades são a “Mulher Maravilha”, uma super-heroína que, aparentemente, consegue “dar conta” de maneira impecável de todas as atribuições. Porém, o custo de manter essa imagética reforça um padrão cansativo de ser sustentado sem cuidado, descanso e condições dignas para uma ascensão profissional, por exemplo.

Uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (2018) apresentou dados comprovando a desigualdade de gênero, no qual a mulher dedica 20,9 horas/semanais em atividades domésticas, enquanto homens dedicam apenas 10,8 horas/semanais. Além de todo o tempo de entrega às tais atividades, a mulher ainda sim precisa demandar tempo para qualificações profissionais a fim de se manter e manter seus dependentes financeiramente.

Uma outra disparidade importante para a seguinte reflexão da sobrecarga feminina é de um estudo realizado na pandemia da Covid-19 (2021) pelo levantamento brasileiro Parent in Science (País na Ciência, do inglês), com docentes, pesquisadores e alunos de mestrado, doutorado e pós-doutorado, contando com 2 mil respondentes, no qual 70% da amostra eram mulheres. Esse estudo demonstrou que 40% das mulheres sem filhos não conseguiram concluir seus artigos científicos em via de publicação, contra 20% dos homens. Os dados se mostram ainda mais alarmantes quando analisado mulheres com filhos na mesma condição, 52%, para 38% de homens, contribuindo progressivamente para a economia do cuidado.

O grande questionamento aqui é como as mulheres irão conseguir dividir funções de cuidado, divisões de tarefas domésticas, responder uma pressão moral e estética de seus corpos e ainda sim ser uma grande profissional? A resposta é clara: Não dá! O adoecimento é real. Cada vez mais mulheres estão doentes, sobrecarregadas e cansadas! Todos esses disparadores aqui apresentados são demonstrados pelos dados do relatório “Esgotadas” da Think Olga, no qual sete em cada 10 pessoas que receberam o diagnóstico de ansiedade ou depressão no Brasil são mulheres, acompanhados de baixa estima, estresse, fadiga, irritabilidade, insônia e tristeza.

Um outro estudo da The Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME) constatou que 49 milhões de pessoas no Brasil que vivem com algum transtorno mental ou abuso de substâncias em 2019, eram mulheres (53%), além de 45% de 1 mil entrevistadas afirmarem maiores casos de diagnóstico de transtornos mentais, com prevalência de ansiedade e depressão decorrentes de dificuldades de conciliar as diversas áreas da vida e insatisfação com a situação financeira.

Percebe-se que essa disparidade de dados aqui demonstradas, reforçadas por uma cultura machista e patriarcal, só prejudica e sobrecarrega mulheres. É preciso pensar e repensar todo esse sistema e agir com uma conduta prática e rápida por uma política de cuidado à mulher, assim como oportunidades e divisões justas de trabalho, sejam elas domésticas, de cuidado ou profissional, em um âmbito micro a macrossocial. Não dá mais para associar as múltiplas funções exercidas apenas por mulheres como uma atitude de louvor, como se estas fossem super-heroínas, se as suas capas arrastam consigo cansaço, frustração, má autoestima e tristeza.

Profª. Dhâmaris Fonseca do Amarante
Docente do Curso de Psicologia do Centro Universitário Ateneu
Especialista em Gênero e Sexualidade, graduada em Psicóloga (CRP 11/17528) e terapeuta sexual

Saiba mais sobre o Curso de Psicologia da UniAteneu.