Quando criança, nós vamos criando uma ideia de o cientista sempre estar usando jaleco, misturando líquidos em frascos de laboratório, um cabelo desgrenhando e com uma cara e atitude de louco (ou genial). Qual criança não se encantaria com essa ideia de cientista reforçada no inconsciente coletivo por uma série de filmes, séries e mídias diversas. Muitos de nós cientistas de hoje imaginávamos a ciência como um momento de pura inspiração. Iríamos gritar “eureca”, ao termos uma ideia genial e, com isso, mudaríamos o mundo para sempre e quem sabe sermos reconhecidos no processo, mas ai chega a realidade.
Quando entrei na faculdade de Veterinária, eu tinha essa construção na minha mente do que era ser um cientista e achava que eu eventualmente iria mudar o mundo, fazer descobertas geniais e que iriam impactar toda a sociedade durante anos, décadas e quem sabe até milênios. Mal sabia eu o quão longe da verdade eu estaria. A pesquisa científica é feita de uma maneira a não favorecer novas ideias. Explico: Existem agências de fomento que financiam as pesquisas e essas agências geralmente são ligadas ao estado, de maneira que existem agências federais e estaduais.
Os critérios que essas agências utilizam para financiar os cientistas é a quantidade de material publicado em periódicos com conteúdo científico, ou seja, quanto mais artigos publicados maior será a verba destinada aos cientistas e maior será a relevância na comunidade científica para aquele grupo de cientistas inseridas naquele determinado lugar do tempo e espaço.
Esse modelo gera uma série de distorções, tais como: uma série de publicações extremamente parecidas apenas para gerar uma quantidade maior de publicações, cientistas que estão sempre no limite do orçamento e que por isso se submetem a fazer pesquisas que sabem que irão gerar mais publicações e que dificilmente podem se dar ao luxo de ter novas ideias e testá-las ao longo de vários anos e o modelo ainda gera uma quantidade grande de cientistas que fazem ciência sem acreditar muito no poder transformador que a mesma pode ter, pois o modelo existente leva a uma série de frustações que não podem ser sanadas apenas por idealismo puro e simples.
Olhando em perspectiva, grandes cientistas como Einstein tiveram pouquíssimos artigos publicados. Einstein teve seis artigos publicados durante toda a sua vida acadêmica, mas que tiveram um impacto no mundo sentido até os dias de hoje. Deveria ser esse o modelo adotado para fazermos ciência, um modelo que vise impactar o mundo contribuindo com novas descobertas revolucionárias que impactem na vida das pessoas e não um modelo que vise apenas números frios com uma ciência que não impacta na vida de ninguém e fique restrita ao meio acadêmico.
Esse modelo só gera egos inflados e pouco impacto social. Deveríamos repensar o que é ser cientista, pois o modelo do imaginário popular é muito mais interessante e necessário do que o da vida real e ele que deveríamos estar buscando com todas as nossas forças, quem sabe assim não conseguiríamos chegar a um ponto além de uma sociedade pueril, sem perspectiva e com problemas sociais graves que poderiam ser resolvidos com boa ciência. Quem sabe um dia, sigamos até lá com o que temos, mesmo com todas as falhas e distorções, eu sempre serei pró ciência, não importa o quanto isso me custe.
Prof. Lucas Diniz Gonçalves
Docente do Curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário Ateneu.
Especialista em Clínica Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais e graduado em Medicina Veterinária.
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