Moda: os pilares da sustentabilidade e como não sucumbir ao fenômeno da moda sustentável sem propósito?

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Vamos começar lembrando o que significa “Moda”. Entendemos que Moda “é um fenômeno social de reconhecimento de grupos que influencia comportamentos e que traz no seu contexto, mudanças rápidas que envolvem diferentes setores da vida coletiva” e conquistou todas as esferas da vida social, influenciando comportamentos, gostos, ideias, artes, móveis, roupas, objetos e linguagem” (CALANCA, 2011, p. 13). Vocês já devem ter ouvido esse conceito, mas também existe o conceito de que moda é apenas a roupa referente a cada período, pois afinal de contas o mundo muda e precisamos da roupa para nos proteger, certo? Errado.

A roupa ou o vestuário nunca foram apenas meros elementos de proteção, mesmo nos períodos mais antigos, como na pré-história, eram ligados a significados maiores, lê-se “a roupa inicia a sua trajetória social ainda no período paleolítico. Cobrir o corpo era necessário para proteger, adornar e diferenciar” (SCOZ, 2019, posição 99), mesmo tendo o fenômeno da moda surgido depois, como afirma Lipovetsky (2017)  que embora durante um grande período, a moda tenha ficado restrita às cortes europeias e/ou classes sociais dominantes, esta evoluiu, se diversificou e se desenvolveu até se tornar um fenômeno onipresente, uma força hegemônica que surgiu na modernidade e é elemento essencial da contemporaneidade.

E o designer, profissional de Design de Moda, tem influência sobre a imagem de moda e sobre as necessidades e desejos criados. A própria palavra design que tem a sua origem remota no latim (CARDOSO, 2008, p. 20) funciona como um verbo que caracteriza o ato de desenhar. O que no nosso caso, poderíamos associar ao ato de desenhar ou designar o que é desejado e o que deve ser usado pelo consumidor, estimulando a compra e trazendo assim lucro para as empresas. Mas em um momento como o que estamos passando de preocupação ambiental, será apenas o lucro importante?

Elkington (1997) argumenta que tão importante quanto os lucros, são os custos e o retorno ambiental e social, e os conceituou como “Triple Bottom Line: Profit – Planet – People, dando origem aos três pilares da sustentabilidade: ambiental, social e financeiro. Além dos três pilares da sustentabilidade, é importante salientarmos também o quarto pilar, o Cultural, que se tornou público em 2001, com o livro de Jon Hawkes, The Fourth Pillar of Sustainability – Culture’s essential role in public planning, onde o autor defendeu a importância e a valorização da cultura na gestão pública para que se possa avaliar o passado, e planear o futuro (HAWKES, 2001):

“A cultura deve ser um ponto de referência separado e “distinto”. O que quer dizer que os quatro pilares da sustentabilidade são: Vitalidade cultural: bem-estar, criatividade, diversidade e inovação. Equidade social: justiça, engajamento, coesão, bem-estar. Responsabilidade ambiental: equilíbrio ecológico. Viabilidade econômica: prosperidade material”. (HAWKES, 2001, p.25, tradução livre da autora)1

Além do que tem-se a vivência ligada à cultura e as tradições familiares, produtos manuais de design artesanal, que ao serem analisados percebe-se a presença do valor  cultural com mais frequência. Umas das probabilidades da presença deste em comunidades, é pelos produtos serem feitos por pessoas que, provavelmente, tiveram acesso a uma formação mais limitada, no entanto, menos regulamentada aos padrões industriais de criação e desenvolvimento.

O fato dos produtos não se balizarem a tendências sazonais, e fazerem uso de técnicas artesanais tradicionais passadas de geração em geração, também é um ponto a ser considerado. Contudo, é provável que a inexistência de uma aprendizagem não delimitada auxilie nesse desenvolvimento criativo e abrangente. Levanta-se assim a questão: o artesanal ou semi-artesanal seria, portanto, um meio sustentável de se criar moda? Um meio que, a partir de sobras, retalhos, peças descartadas de pós-consumo, se conseguirá dar uma vida nova ao que tradicionalmente iria parar no lixo em aterros? Valorizar o trabalho artesanal será uma base imprescindível ao desenvolvimento sustentável?

Ao falarmos de moda sustentável, é comum a discussão sobre a necessidade de mudanças, geralmente relacionadas ao consumo de moda, mais especificamente ao hiperconsumo desta. O ato de compra de vestuário não deixará de existir, já que este faz parte da vida em sociedade. O que nos leva diretamente a outro ponto de grande importância, que é o descarte de peças de vestuário de pós-consumo. Ou seja, roupas que foram compradas, usadas e descartadas, muitas vezes de forma prematura, tornando-se grandes agentes poluentes em aterros de todo o mundo.

Diminuir os impactos negativos ao meio ambiente, por meio da ressignificação ou transformação destes descartes, num novo produto é, portanto, uma ação extremamente necessária; mas como tornar real e possível essa ideia? E como fazer moda sustentável, sem cair no “fenômeno da moda sustentável”? Atualmente, é mais comum ouvirmos falar de sustentabilidade na moda ou no design, e embora não seja um assunto tão recente, ainda existe muito caminho a ser trilhado para se chegar a uma mudança realmente significativa relacionada a criação de produtos sustentavelmente adequados. Acreditamos que uma das formas de se conseguir essa mudança é através do desenvolvimento de um trabalho que parta da base do desenvolvimento criativo, ou seja, dos próprios designers de moda, em formação e especialização.

Ao estudarmos o design para a sustentabilidade, segundo Salcedo (2014), entendemos que o profissional envolvido nesse processo precisa entender que a sustentabilidade não é algo a ser agregado ao produto pronto, ou ao processo de design, mas deve fazer parte deste e ter um propósito. Esse entendimento amplia a criação de novas alternativas ainda na fase de conceção ou de pesquisa do produto, para que se torne parte fundamental deste, tendo como intuito a redução do impacto.

Com esse direcionamento é que a consciência sustentável deve estar dentro do processo de criação, a partir dos designers e criadores. Portanto, convido todos por meio de experimentação prática, a testar novos métodos de desenvolvimento de produto com propósito sustentável, e passarmos a enxergar a moda e a sustentabilidade com outros olhos, e com reais propósitos.

Profª. Ma. Fernanda Farias Vasconcelos Kreitlow
Docente do Curso de Design de Moda do Centro Universitário Ateneu
Doutoranda em Design de Moda, mestra em Gestão de Negócios Turísticos, especialista em Styliste Coloriste Infographiste, graduanda em Artes e graduada em Design de Moda.

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