Para discutirmos sobre a ciência do Urbanismo, seus campos de atuação, suas atribuições e, principalmente, sobre os agentes sociais produtores do espaço urbano, necessitaremos estruturar essa análise, entre tantos conceitos, sobre uma classificação definida pelo geógrafo Roberto Lobato Corrêa, para o qual o espaço urbano é produzido pela ação dos proprietários dos meios de produção, dos proprietários fundiários, dos promotores imobiliários, do Estado e dos grupos excluídos. São esses agentes que modelam o espaço urbano, que produzem sua paisagem urbana e definem sua dinâmica. Nós, arquitetos e urbanistas, podemos nos apropriar de forma segura de tal conceituação como ferramenta de análise das dinâmicas socioespaciais que se estabelecem nas cidades brasileiras.
A relação entre tais agentes sociais urbanos podem ser, ora harmoniosa, uníssonas e consensuais, ora conflitantes, dicotômicas e até mesmo, dependendo do contexto estarem em “rota de colisão”, mas sempre imbricadas e nunca em condições de equilíbrio, paridade e equidade. Mais comumente se observa com certa profusão essa última condição de antagonismo entre os “detentores do capital”, que aqui por melhor didatismo chamarei de “especuladores imobiliários”, da mesma forma que o “Estado”, chamarei de “gestor público” e o grupo de “excluídos”, que será aqui definido como os “moradores das comunidades fragilizadas socialmente”.
Para melhor compreensão da questão abordada, precisamos apreender que o objetivo principal do Urbanismo é manter, preservar e conservar os espaços urbanos e, se necessário, resgatar a qualidade espacial do espaço estudado que se encontra em condições insalubres. Precisamos entender também que a natureza da ciência do Urbanismo é “preventiva”, ou seja, a intervenção urbana, enquanto ferramenta da prática do Urbanismo, deve ser efetivada antes que as atecnias, ilicitudes e ocupações urbanas irregulares se legitimem pelo uso no decorrer dos anos. O intuito de se anteceder ao problema de uso indevido do espaço urbano é evitar a malversação de espaços vitais, fazendo com que este possa logo ser inserido/incluso dentro de um contexto urbano com o acréscimo de equipamentos/mobiliários urbanos/desenho urbano/estética urbana que o equiparem às demais áreas da cidade. Tal equiparação fomenta a igualdade social, tão necessária para uma prática cidadã sadia e civilizada.
Na prática ocorre o inverso. A intervenção urbana, independentemente de sua modalidade, assume para si uma natureza “corretiva”, e de forma paliativa tenta reparar os danos causados, no território e paisagem pelo uso irregular dos mesmos, pela ocupação ilícita e inadequada de terrenos, que geram toda sorte de mazelas urbanas e que foram legitimadas pela ocupação prolongada e pela morosidade burocrática/omissão/conivência do gestor público. Ante este quadro, muitas vezes de irreversibilidade dos danos causados, este procura corrigir algo que não possui mais correção, ficando ao nível de soluções superficiais que tão somente “mascaram” o verdadeiro problema, oficializando assim a sectarização, a excludência, o preconceito e a discriminação social.
A este quadro de ingerência por parte do gestor público, podemos associar os interesses dos especuladores imobiliários. São estes que através de suas influências, sejam políticas, sejam econômicas, valorizam e desvalorizam áreas das cidades em benefício pessoal e em detrimento da população, mais notadamente daquela parcela que habita as áreas marginalizadas e fragilizadas socialmente. É comum observar que, via de regra, os gestores públicos, advogam os interesses dos especuladores imobiliários, quando não os são em pessoa. Tal condição compromete por completo a função social do Urbanismo e vem se tornar seu maior desafio que é ser devidamente exercido dentro de uma esfera de influências que muitas vezes se contrapõem a sua proposta primordial que é levar dignidade de existência a qualquer coletividade!
Prof. Dr. Frederico Augusto Nunes de Macêdo Costa
Coordenador de Arquitetura e Urbanismo e Design de Interiores da UniAteneu
Doutor em Planejamento Urbano, mestre em Geografia Urbana, especialista em Gestão Ambiental e em Geoprocessamento Aplicado à Análise Ambiental e aos Recursos Hídricos e arquiteto e urbanista
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