É consenso que a informalidade das ocupações e a favelização tem atingido proporções absurdas nas capitais das principais metrópoles brasileiras. E Fortaleza não escapa deste cenário. Existe um “projeto de cidade” para nossa capital muito bem definido, principalmente, pelo setor imobiliário e da construção civil, projeto este pactuado com gestores municipais e vereadores, e que historicamente não enfrenta a questão do acesso à terra urbanizada e bem localizada e da moradia digna para grande parcela da nossa população.
O Censo de 2023 vai dizer que essa parcela deve representar bem mais que os 40% da população em assentamentos precários contabilizada no ano de 2012 (Dados do Plano Local de Habitação de Habitação de Interesse Social/PLHIS – PMF). Estamos em pleno processo de revisão deste Plano Diretor (política de desenvolvimento urbano e segunda lei mais importante do município) que tem a “obrigação legal/constitucional” de ser um processo participativo, e que acontece em uma conjuntura de complexas alterações nas relações de governança e de poder político local (Estado ultraneoliberal policialesco – movimentos sociais/lideranças comunitárias em um contexto de disputas: – facções – milícias etc.); alterações atreladas à quase inexistente apropriação por parte da população de importantes instrumentos legais de garantia do Direito à Cidade e à Moradia Digna, como aqueles trazidos pela Constituição Federal/1988 e pela Lei Estatuto da Cidade/2001.
Estes são os instrumentos que estão em nosso plano diretor municipal desde 2009, e que não foram regulamentados e efetivamente implementados na política urbana local: as Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis), sobretudo, as Zeis de vazios urbanos; o parcelamento, edificação e utilização dos compulsórios/IPTU progressivo no tempo/desapropriação com pagamento em títulos da dívida pública; direito de preempção; consórcio imobiliário, entre outros.
Nesse momento, você deve estar pensando: “Nomes difíceis? Parece complexo!? Não vai influenciar nada na minha vida…”. Mas em vez de perguntarmos “por que tenho que entender disso?”, deveríamos nos perguntar “por que o grande empenho daqueles envolvidos com a revisão do plano diretor para que continuemos sem entender sobre tudo isso?”. E também entender sobre esses instrumento para que a população, ou parte dela, possa ter alguma condição de efetivamente influenciar o “projeto de cidade” que está em curso. Um projeto que infelizmente mais excluiu do que leva moradia digna para a maior parte desta população.
Tudo isso para afirmar: Não adianta revisar um plano diretor, uma lei tão importante, e não capacitar/informar para a participação de forma autônoma e legítima da população e seus movimentos sociais organizados. Um processo realmente participativo, tem que primeiro sensibilizar e capacitar, só assim as pessoas se mobilizam para participar. Se isso não acontece, mais uma vez o planejamento da cidade e dos investimentos estatais vão beneficiar apenas um segmento da sociedade local, um “projeto de cidade”.
Profª. Drª. Joísa Barroso
Docente do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Ateneu
Doutora em Planejamento Urbano e Regional, mestra em Desenvolvimento e Meio Ambiente e graduada em Arquitetura e Urbanismo
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