A dor crônica representa um dos maiores desafios da prática clínica contemporânea, especialmente, quando se manifesta em síndromes complexas como a fibromialgia. Segundo a International Association for the Study of Pain (IASP, 2020), a dor é uma experiência sensorial e emocional desagradável, que envolve componentes multidimensionais – sensório-discriminativos, emocionais, cognitivos e socioculturais – e, por isso, demanda estratégias terapêuticas igualmente amplas e integradas.
Nesse contexto, as correntes eletroanalgésicas, como a Estimulação Elétrica Nervosa Transcutânea (Tens), surgem como um recurso seguro, não invasivo e de baixo custo para o alívio da dor, sendo amplamente reconhecido na literatura científica e nas diretrizes clínicas modernas. Como destaca Liebano (2021), a eletroterapia, quando aplicada com parâmetros adequados e baseada em avaliação individualizada, pode modular a dor por mecanismos periféricos, espinais e centrais, favorecendo a liberação de opioides endógenos e a inibição da transmissão nociceptiva.
A fibromialgia, caracterizada por dor musculoesquelética difusa, fadiga, distúrbios do sono e alterações cognitivas, desafia os modelos tradicionais de tratamento baseados apenas na farmacologia. Nesse cenário, a abordagem fisioterapêutica com Tens tem se mostrado promissora. Estudos recentes apontam que a Tens, principalmente, de alta frequência (80-100 Hz) com intensidade sensorial tolerável, promove alívio da dor imediata e melhora da funcionalidade em pacientes com fibromialgia, sem efeitos colaterais relevantes.
Contudo, o uso desse recurso ainda enfrenta resistência por parte de alguns profissionais, seja pela falta de conhecimento técnico, seja por um apego a modelos biomédicos centrados na medicação. Precisamos romper com essa limitação. Como reforça a Iasp (2020), o manejo da dor crônica deve ser interdisciplinar, envolvendo educação em dor, exercício físico, terapia cognitivo-comportamental e intervenções físicas como a eletroanalgesia.
Assim, a Tens não deve ser vista como um tratamento isolado, mas como parte de um plano terapêutico integrado e centrado na pessoa. A prática clínica tem demonstrado que a adesão ao uso da Tens é alta quando o paciente é orientado adequadamente, e que os benefícios podem se estender ao bem-estar emocional, à qualidade do sono e à redução do uso de analgésicos. Portanto, é dever do fisioterapeuta dominar os princípios neurofisiológicos da eletroanalgesia e aplicá-los de forma ética, segura e fundamentada, contribuindo para uma assistência de qualidade e baseada em evidências.
Finalizo este artigo com uma reflexão: se a dor crônica exige soluções plurais e humanizadas, por que não investir em recursos que empoderem o paciente, promovam analgesia sem dependência medicamentosa e fortaleçam o protagonismo da Fisioterapia? As correntes eletroanalgésicas são, sem dúvida, um passo nesse caminho.
Referências
- International Association for the Study of Pain. Terminologia revisada e definição da dor. IASP. 2020. Disponível em: https://www.iasp-pain.org/resources/terminology/
- LIEBANO, R. E. Estimulação elétrica nervosa transcutânea. In: LIEBANO, R. E. Eletroterapia aplicada à reabilitação: dos fundamentos às evidências. Rio de Janeiro: Thieme Revinter, 2021. p. 87–101.
Profª. Drª. Paula Pessoa de Brito Nunes
Docente do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário Ateneu.
Doutora e mestra em Saúde Coletiva, especialista em Fisioterapia Dermatofuncional e em Fisioterapia Neurológica Funcional e graduada em Fisioterapia.
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