As implicações do uso de bicos para a saúde infantil são amplamente descritas na literatura e as diretrizes que desaconselham o seu uso apoiam-se na associação frequente com o desmame precoce e a interrupção da amamentação exclusiva (AME), além de outras repercussões para o desenvolvimento infantil. No Brasil, o Ministério da Saúde desaconselha o uso de chupetas e mamadeiras em crianças amamentadas e têm duas políticas públicas que pautam especificamente a temática do uso de chupetas e mamadeiras, ambas relacionadas à promoção da amamentação (AM): Lei 11.265/06, que regulamenta a Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para Lactentes Crianças de Primeira Infância, Bicos, Chupetas e Mamadeiras (NBCAL) e a Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC).
As principais evidências sobre o efeito negativo do uso dos bicos são:
1) Funções orais: sucção, deglutição, mastigação, respiração, fala e linguagem oral prejudicadas;
2) Dentição: bicos são fatores de risco para maloclusões;
3) Otite média aguda: o uso de bicos prejudica o estímulo do músculo tensor do palato membranoso, o principal responsável pela abertura da tuba auditiva e que tem um importante papel na prevenção de otites médias;
4) Segurança química, física e imunológica: bicos são potenciais reservatórios de infecção; cândida é mais comum em usuários de bicos do que em não usuários; risco de asfixia é causado por partes e acessórios que se desprendem da chupeta;
5) Níveis de inteligência: o uso de chupeta foi uma das variáveis preditoras que mais influenciou de forma independente o menor desempenho em testes de inteligência na vida adulta. A hipótese é que criança que utiliza a chupeta é menos solicitante por atenção e como consequência passa a ser menos estimulada por seus pais ou pessoas com quem ela convive.
6) Vícios orais na vida adulta: o uso prolongado de chupetas e mamadeiras na infância pode ser substituído ao longo da vida por fumar, comer excessivamente ou em outros transtornos compulsivos.
Entretanto, argumentos em favor do uso de bicos artificiais também existem. Apesar de controverso, o uso da chupeta para estimulação da sucção não-nutritiva em recém-nascido prematuro que é alimentado por meio de sonda nasogástrica tem sido recomendado para propiciar transição mais rápida para a alimentação via oral, além de maior ganho de peso e menor tempo de hospitalização. Estudos que utilizaram tal técnica de estimulação não consideraram se houve, posteriormente, interferência na dinâmica da sucção e nas taxas de AME.
Outro argumento seria o efeito protetor da chupeta contra a Síndrome da Morte Súbita Infantil (SMSI). Uma metanálise indica que o uso de chupeta diminuiu o risco de morte súbita, especialmente, quando essa é oferecida na hora de dormir. Posteriormente, o mesmo grupo de pesquisadores conduziu uma nova metanálise sofre o efeito protetor da AM na SMSI e concluiu que a AME protege o lactente da morte súbita independente dos demais fatores de risco.
O efeito tranquilizante da chupeta sobre o comportamento agitado do bebê também é um argumento a favor do uso da mesma. Além disso, o uso de chupeta tem sido recomendado no manejo da dor/desconforto em bebês que tiveram complicações no pós-parto e em procedimentos invasivos, e por sua vez, a mamadeira é amplamente usada para alimentar bebês, pois cuidadores relatam trazer mais segurança e ser mais fácil de usar quando comparada ao copo, por exemplo.
As evidências são consistentes de que o desmame precoce entre um a 24 meses é mais frequente em crianças que usam chupeta e mamadeira quando comparadas com crianças que não possuem esses hábitos. Por essa razão, cabe a nós, profissionais da saúde, transmitir informações aconselhando as famílias com relação aos prós e contras do uso de bicos a curto e a longo prazo para a AM e suas repercussões para a saúde infantil, além de fortalecer a habilidade e a segurança dos pais e cuidadores em manejar o choro da criança.
Referências bibliográficas
- Perilo, Tatiana Vargas Castro. Tratado do especialista em cuidado materno-infantil com enfoque em amamentação. Belo Horizonte: Mame Bem, 2019.
- Buccini, GS. Evolução do uso de chupeta e sua influência no aleitamento materno exclusivo no Brasil, 1999-2008: Universidade de São Paulo; 2017.
- Hauck, F. R., Thompson, J. M. D., Tanabe, K. O., Moon, R. Y., & Vennemann, M. M. (2011). Breastfeeding and Reduced Risk of Sudden Infant Death Syndrome: A Meta-analysis. PEDIATRICS, 128(1), 103–110. doi:10.1542/peds.2010-3000.
- Hauck, F. R. (2005). Do Pacifiers Reduce the Risk of Sudden Infant Death Syndrome? A Meta-analysis. PEDIATRICS, 116(5), e716–e723. doi:10.1542/peds.2004-2631.
Profª. Mariana Laprovítera Teixeira Carneiro
Docente do Curso de Odontologia do Centro Universitário Ateneu
Mestranda em Ciências Odontológicas, especialista em Aleitamento Materno com ênfase em Neonatologia, em Odontopediatria e em Implantodontia e graduada em Odontologia
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