A maioria dos assentamentos precários em áreas valorizadas da cidade de Fortaleza foi definida como Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis) na lei do Plano Diretor Participativo de Fortaleza (PDPFor), em 2009. Nesta lei, foram indicadas 134 Zeis: 44 do tipo I – Zeis de Ocupação, 56 do tipo II – Zeis de Conjunto Habitacional e 34 do tipo III – Zeis de Vazio. As Zeis não foram distribuídas de modo uniforme pelo território da cidade: existindo uma concentração em certas áreas, bem como a retirada de muitas áreas consideradas bem localizadas.
Vale salientar que a Zeis do Lagamar, um dos primeiros e maiores assentamentos precários de Fortaleza, só foi incorporada por grande pressão popular, através de uma lei complementar no ano seguinte à promulgação do PDPFor. Esse fato reforça a importância que este instrumento assumiu para a dinâmica política comunitária e que os objetivos desse instrumento entram em conflito direto com a lógica da propriedade privada fundiária e imobiliária.
O PDPFor/2009, além de contemplar todos os instrumentos da Lei Federal Estatuto da Cidade, entre eles as próprias Zeis, trouxe especificidades para a regularização fundiária em Zeis 1 – de ocupação, a qual deve ser primeiramente planejada através do Plano Integrado de Regularização Fundiária (PIRF). Por ser um instrumento de planejamento que aborda os diversos âmbitos da regularização fundiária de interesse social: social, econômico, ambiental, urbanístico, edilício e jurídico (da posse/propriedade), o PDPFor/2019 estipulou como requisito fundamental a participação da comunidade moradora da Zeis em todo o processo de elaboração do PIRF.
E que, após a sua aprovação pelos representantes dos moradores (Conselho Gestor), o PIRF deve ser instituído em forma de Decreto Municipal. Vale salientar que o PDPFor apresenta a possibilidade da elaboração de um único PIRF com abrangência de mais de uma Zeis, garantindo a gestão do processo pelos respectivos Conselhos Gestores de cada território/Zeis agraciados pelo plano.
É importante destacar que o PIRF deve trazer uma normatização especial de parcelamento, edificação, uso e ocupação do solo para a Zeis, estabelecendo as diretrizes e os novos índices e parâmetros urbanísticos específicos da área para regularização; e áreas mínimas e máximas para lotes de novos parcelamentos na área regularizada, bem como regras para o remembramento de lotes. Por fim, os usos compatíveis com o uso residencial e percentuais, segundo os tipos de usos permitidos na Zeis.
Outra importante questão inserida nas competências do PIRF foi a de identificar os imóveis não edificados, subutilizados ou não utilizados dentro da Zeis ou no seu entorno próximo. São imóveis com potencial para o uso habitacional, devendo ainda serem elaborados projetos de intervenções de caráter urbanístico (FORTALEZA, PDPFor, 2009, art. 272, incisos III e IV). Deveria o PIRF definir os procedimentos e instrumentos jurídicos para a promoção da regularização fundiária, levando em consideração a condição fundiária existente e prevendo os mecanismos possíveis, de forma mais efetiva, a serem utilizados pelo Poder Público.
O PDPFor trouxe a prerrogativa que o PIRF deveria promover processo de planejamento da questão da geração de trabalho e renda na e para a Zeis, devendo este plano definir diretrizes e ações que promovam a Economia Solidária, a formação de redes e parcerias entre os atores públicos e privados que atuam na Zeis; e ações para o aproveitamento da mão de obra local nas intervenções previstas para a Zeis no decorrer da implementação do PIRF (FORTALEZA, PDPFor, 2009, art. 274). Esse plano, assim como os demais o PIRF, devem ser articulados e implementados a partir do Plano de Participação Comunitária e Desenvolvimento Social.
Apesar dos avanços alcançados em texto de leis promulgadas nacional e localmente, observamos que a influência das Zeis na execução da política urbana e fundiária de Fortaleza, sobretudo, na política habitacional, tem sido mínima, se não inexistente. Pesquisas do Laboratório de Estudos da Habitação (Lehab/DAU/UFC) apontam que esses avanços foram rapidamente perdendo as suas validades legais, “dada a morosidade com que os planos e as leis regulamentadoras e complementares vieram a ser conduzidas”.
Tem-se ainda, os conflitos internos entre secretarias afins, a falta de recursos humanos e a precariedade administrativa, sobretudo, na relação com os processos de terceirização das atribuições técnicas. Os PIRF ou não tem sido implementados ou ignorados, sendo realizadas obras que não condizem com aquilo que foi colocado nos planos. É desperdício de recursos e desrespeito das comunidades que se organizaram para tanto se tornarem Zeis, como terem seu processo de regularização fundiária executados.
Profª. Drª. Joísa Barroso
Docente do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Ateneu
Doutora em Planejamento Urbano e Regional, mestra em Desenvolvimento e Meio Ambiente e graduada em Arquitetura e Urbanismo
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